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Texto publicado na última edição da revista BiodieselBR.

Criado em 2005, o Programa Brasileiro de Produção e Uso do Biodiesel (PNPB) é uma conquista da nação. Em sua trajetória, destacam-se a inclusão produtiva de milhares de agricultores familiares, a redução das emissões de Gases do Efeito Estufa (GEE) pelos veículos de ciclo diesel, a contribuição para a melhoria da qualidade do ar nas grandes cidades, a participação na redução das importações de diesel fóssil, a agregação de valor doméstica aos óleos vegetais e gorduras animais, a geração e disseminação da riqueza agropecuária brasileira. 

Programa do Biodiesel é um sucesso. Os números falam por si:

1. Agricultura familiar: por ano, segundo o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), cerca de R$ 3 bilhões em matérias-primas são adquiridos diretamente dos mais de 85 mil agricultores familiares envolvidos no PNPB. Esses produtores têm no programa do biodiesel uma oportunidade ímpar tanto para o aumento de sua renda quanto na forma de aprimoramento técnico; 99% dos agricultores entrevistados pelas empresas associadas à Abiove classificaram o programa como ‘bom’ ou ‘ótimo’, mesmo percentual dos que apoiam a ampliação da mistura de biodiesel no diesel B;

2. Emissões de GEE: estudo da Delta CO2 mostra que o biodiesel de óleo de soja mato-grossense consumido no interior do estado de São Paulo emite 70% menos gases do efeito estufa do que o diesel mineral. Com o uso do B7, o Brasil reduz suas emissões de GEE em 5% em comparação ao diesel mineral puro; a mitigação dessas emissões poderá chegar em breve a 7,5%, com o uso do B10, e a 15%, com o uso do B20. Atualmente, em se tratando de emissões de GEE, o uso do biodiesel no país equivale ao plantio anual de 7,2 milhões de árvores;

3. Qualidade do ar: as emissões dos escapamentos dos veículos causam diversos danos aos habitantes dos grandes conglomerados urbanos. O uso do biodiesel reduz sensivelmente as emissões de materiais particulados, hidrocarbonetos e monóxido de carbono, substâncias malignas à saúde. Estudos recentes do professor Paulo Saldiva, do Instituto Saúde e Sustentabilidade, apontam que o uso do B7 ajuda a evitar cerca de 200 mortes por ano, tomando como base apenas os municípios de São Paulo e Rio de Janeiro. A utilização do biocombustível evita ainda, todos os anos, milhares de internações hospitalares vinculadas a problemas cardiorrespiratórios;

4. Importações de diesel: conforme dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior e da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), a participação do diesel fóssil importado nas vendas nacionais de diesel B foi, em 2014, de 19%. Em 2015 a dependência das importações se mantém no patamar dos 16%, em grande parte devido à vigência do B7. Estima-se que em 2015 o Brasil economize algo entre US$ 200 milhões e US$ 250 milhões;

5. Agregação de valor: conforme o percentual de mistura de biodiesel no diesel aumenta, eleva-se também a quantidade de soja processada em solo nacional. Tomando 2015 como exemplo, estima-se que as mais de 39 milhões de toneladas de soja processadas superem em 8% o volume de 2013, último ano completo com vigência do B5. Historicamente, mais biodiesel significa também maior produção de farelo e óleo de soja, ou seja, incentiva-se a agregação de valor em detrimento da exportação do grão in natura;

6. Mais riqueza e renda no interior: além dos benefícios ambientais que atingem principalmente os grandes centros urbanos, no interior do Brasil vislumbram-se ganhos econômicos importantes ao longo do setor do biodiesel. Usinas floresceram nas cinco regiões do país; empregos foram gerados, no campo e na cidade; a produção agropecuária teve, no biodiesel, mais um propulsor. Trata-se, sem dúvida, de um círculo virtuoso, no qual a produção gera benefícios e os benefícios gerados embasam maior demanda pelo biocombustível.

Não obstante o sucesso do programa, sempre caberá aos agentes envolvidos manter um olhar zeloso para o futuro. Foi olhando à frente que, passados dez anos, saltou-se do zero absoluto para mais de 4 bilhões de litros fabricados, a segunda maior produção mundial de biodiesel. Foi dessa forma que se atingiu o atual patamar de excelência em qualidade, haja vista que a especificação do biodiesel brasileiro é uma das mais rigorosas do planeta. Foi com a visão de futuro, e com uma agenda de diálogo aberta e constante com o governo, que desafios logísticos foram superados. Assim também se desenvolveu um sistema de leilões transparente, onde são premiados os agentes mais eficientes, redundando na correta precificação do biodiesel pelo mercado.

O futuro virá, e é pensando nele que novas propostas de aprimoramento setorial devem ser discutidas, elaboradas e implementadas.

Nesse sentido, cabe à discussão a formatação de um novo modelo de habilitação das usinas nos leilões de biodiesel da ANP: a Abiove defende um modelo que possibilite redução do tempo de exposição aos riscos de preços e câmbio que as usinas enfrentam, fato que ora traz incertezas indesejadas a todo o sistema de comercialização do biocombustível.

É chegada a hora, ainda, da implementação de ciclos de testes em motores diesel considerando o uso de misturas elevadas de biodiesel, tais como o B10, o B15 e o B20. Em relatório recém-apresentado à Câmara Setorial da Cadeia Produtiva de Oleaginosas e Biodiesel, do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, observa-se que os impactos negativos da utilização desses percentuais sobre o desempenho, durabilidade e consumo em motores de ciclo diesel são insignificantes ou inexistentes. Porém, como os estudos contemplados utilizam- -se de uma grande gama de matérias-primas, em diversos países e em diversos momentos históricos (inclusive no presente), o lançamento de um grupo de trabalho que examine a questão mostra-se conveniente para que a discussão possa ser devidamente aprofundada.

Cabe ainda, no âmbito da Câmara Técnica de Avaliação e Acompanhamento do Selo Combustível Social, do MDA, que se avance no diálogo sobre métodos mais eficientes de cálculo para respaldo ao Selo: a Abiove defende uma modelagem simplificada, que tornaria todo o mercado mais isonômico, maximizando os recursos humanos das empresas e do próprio MDA envolvidos no acompanhamento das aquisições e prestação de assistência técnica aos agricultores familiares do PNPB. Ainda nesse tocante, mostra-se de fundamental importância o estabelecimento de prazos para anuência aos contratos firmados entre empresas e agricultores familiares. Atualmente, muitos desses acordos correm risco de rescisão, devido unicamente à demora na obtenção da anuência aos contratos prévios já assinados por ambas as partes diretamente interessadas na negociação.

Como forma de ampliar os benefícios econômicos inerentes ao PNPB, a Abiove defende a vigência do BX Opcional, que prevê a utilização de teores maiores de biodiesel até o patamar de 10% (B10) quando constatada atratividade econômica pelas distribuidoras. Tal medida propiciaria, por exemplo, uma redução de preços do diesel B ao consumidor, haja vista que as distribuidoras somente avançariam na aquisição do biocombustível em situações nas quais o preço deste se mostrasse inferior ao do diesel mineral. Vale salientar que, em média, o preço do diesel A para a refinaria da Petrobras subiu mais de 40% entre 2010 e 2014; no mesmo período, o preço do biodiesel brasileiro caiu 10%!

Para que ainda maiores sejam os ganhos ambientais e à saúde humana, propõe-se a vigência do B20 Metropolitano, que consiste em tornar obrigatório o uso de 20% de biodiesel em todo o diesel consumido pelas frotas de ônibus urbanos de passageiros em municípios com mais de 500 mil habitantes. As estimativas indicam que mais de 60 milhões de brasileiros seriam beneficiados com um ar mais limpo, proporcionando redução das internações e evitando mortes atribuíveis à exposição à poluição.

Como "viga mestra”, a Abiove defende a implementação de lei que determine a vigência do B10 no ano de 2020, instrumento que traria previsibilidade ao setor. Em um cenário bem definido, mais rápido surgirão novos investimentos em processamento de oleaginosas e refino de óleo, e mais fortemente disseminar- se-ão as externalidades positivas do biodiesel.

O momento atual mostra-se ímpar para superar desafios e aproveitar oportunidades. Estas, se bem aproveitadas, colocarão em movimento o círculo virtuoso que leva ao desenvolvimento regional e à criação de riquezas; caso contrário, perde-se essa chance de aprimoramento da matriz energética nacional com maior uso de fontes limpas e renováveis. O biodiesel está pronto para elevar sua responsabilidade no mercado de combustíveis brasileiro.

ABIOVE - Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais

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